Gastos eleitorais não previstos em lei – necessidade de correlação das despesas com as atividades de campanha – seguro de vida – Por André Gurgel

Não é incomum que no decorrer da campanha surjam dúvidas quanto à autorização para realização de despesas que não estejam expressamente arroladas na legislação. Assim é a dúvida quanto à contratação de “seguro” no curso da campanha.
Como é de conhecimento a legislação define o que deve ser entendido como “gasto eleitoral”. Daí decorre a leitura de que não é o candidato, comitê financeiro ou partido quem define no que, e, aonde “gastar” os recursos de campanha.

As despesas qualificadas como “gastos eleitorais” devem necessariamente estar contempladas em um dos incisos do art. 26 da Lei n. 9.504/97 (reproduzido no art. 30 da Resolução/TSE n. 23.376/12).
Fora desse rol o gasto não está autorizado.

É verdade, contudo, que a enumeração legal dos gastos eleitorais não é exaustiva, não se dá numerus clausus. A redação dos incisos é, em alguns casos, bastante vaga, permitindo interpretação ampliativa a partir do caso concreto. É a hipótese, por exemplo, do inciso VI do art. 26 da Lei n. 9.504/97 (reproduzido no inciso VI art. 30 da Resolução/TSE n. 23.376/12), in verbis:

Art. 26. São considerados gastos eleitorais, sujeitos a registro e aos limites fixados nesta lei:
(…)
VI – despesas de instalação, organização e funcionamento de Comitês e serviços necessários às eleições;

Trata-se de dispositivo legal que faz uso de termos com grande amplitude de significado (em destaque, “despesas com serviços necessários às eleições”). Obviamente, que a expressão contempla uma gama bastante variada de despesas. Portanto, a literalidade do texto não é suficiente para a resposta. Nessas situações o socorro vem de outro lado, do critério de interpretação fixado pela jurisprudência das Cortes Eleitorais.

Assim, diante de uma despesa não expressamente contemplada em um dos incisos do art. 26, deve-se perquirir pela correlação da despesa com as atividades de campanha. Nessa linha, existe precedente do TSE considerando ilegal a contratação de um serviço de consultoria ambiental a fim de elaborar as ações e propostas constantes do plano de governo de determinada candidatura. Obviamente, que o caso noticiado pelo TSE apresentava particulares (tal como o elevado valor pago) que motivou o Tribunal a lançar suspeita sobre a despesa lançada. Entretanto, o precedente revela que o Judiciário está atento.

Por essa ótica, poder-se-ia dizer que, aparentemente, há certa razoabilidade (considerada a correlação da despesa com os trabalhos e serviços envolvidos na campanha) na contratação de seguro de responsabilidade civil a fim de cobrir eventos decorrentes do uso de veículos pela equipe de campanha. Assim como, há certa razoabilidade na contratação de seguro contra danos/furto (e sinistros dessa ordem) envolvendo os equipamentos expostos a uso contínuo na campanha. Do mesmo modo, possível a contratação de seguro pelo candidato, partido ou comitê que tenha por objeto cobrir eventos (tais como, acidente de trabalho incapacitante) envolvendo os colaboradores de campanha.

Contudo, no caso de seguro de vida (exclusivamente), considerando que normalmente (atentando-se aos padrões normais de contratação) não é benefício constante de contrato de trabalho a cargo do empregador, haveria necessidade de identificar (e bem fundamentar) uma razão que justificasse a realização da despesa.

Não creio que seja tarefa fácil achar uma razão para tanto, considerando que o trabalho desempenhado por cabos eleitorais (em situações normais) não apresenta sequer periculosidade.
Esse tipo de benefício indireto (que não guarda correlação com a campanha) somado aos altos valores pagos aos cabos eleitorais, podem trazer o risco de responsabilidade por abuso de poder econômico.

Assim, levando em consideração essas referências de raciocínio, é preciso cautela na contratação de gastos não autorizados pela legislação e que não guardem correlação direta com o objeto dos trabalhos.
Contudo, havendo razão no caso em concreto a justificar a contratação, fica ao menos a sugestão para que o pagamento se dê com base em valores de mercado e, percentualmente, tenha pouca representatividade em relação ao gasto total da campanha.

26.07.2012

André Luís Holanda Gurgel Pereira 

Gravação feita por eleitor sobre tentativa de compra de voto é prova ilícita

Por quatro votos a três, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), na sessão desta quinta-feira (16), considerou ilícita a gravação ambiente feita sem o conhecimento dos interlocutores. Acompanhando o voto do relator, ministro Marco Aurélio, a Corte manteve decisão do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia (TRE-BA), que havia rejeitado a referida gravação como meio de prova e mantido o diploma de Délcio Mascarenhas de Almeida Filho, eleito vereador de Santo Antônio de Jesus-BA, nas eleições de 2008.

Segundo o voto do relator, a gravação ambiente submete-se à regra da inviolabilidade dos dados, sendo que o afastamento da proteção não pressupõe gravações escondidas ou dissimuladas por um dos interlocutores, mas sim decorrentes de ordem judicial e sempre vinculadas à investigação criminal ou à instrução processual penal.

Para o ministro Marco Aurélio, a questão ganha ainda mais relevo quando se trata de processo eleitoral, onde as disputas são acirradas, prevalecendo, muitas vezes, reações passionais. “Penso que na situação em exame houve violação ao direito da intimidade, não se devendo admitir a prova como lícita”, afirmou em seu voto.

O ministro ressaltou, ainda, que se constitui verdadeiro paradoxo reconhecer como válida gravação ambiente feita sem o conhecimento dos interlocutores, tendo em conta admitir-se tal prova somente quando autorizada pelo Poder Judiciário.

A ação de impuganção de mandato eletivo contra Délcio Mascarenhas de Almeida Filho foi promovida pela coligação “Com a Força do Povo” e pelo PMDB municipal, por suposta captação ilícita de sufrágio ou compra de votos. Segundo os autos, o eleitor Israel Nunes dos Santos teria gravado, clandestinamente, utilizando um telefone celular, um suposto oferecimento de dinheiro por seu voto e de sua família.

Os ministros Dias Toffoli, Gilson Dipp e Luciana Lóssio acompanharam o relator. Já os ministros Arnaldo Versiani e Nancy Andrighi divergiram do relator e consideraram a gravação uma prova lícita e, no mesmo sentido, votou a presidente do TSE, ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha.

Fonte: http://www.tse.jus.br/noticias-tse/2012/Agosto