Prática comum no mercado é a aquisição de veículos utilizando-se de algum tipo financiamento realizado junto às instituições bancárias. Isso ocorre porque boa parte da população não possui condições financeiras suficientes para efetuar a compra de um bem que possui alto valor – como é o caso dos veículos – com pagamento à vista.
Desse modo, visando resguardar seus direitos e inibir a inadimplência nos pagamentos, as instituições financeiras realizam contrato de alienação fiduciária em garantia. Tal espécie de alienação consiste na transferência pelo devedor (adquirente do veículo) ao credor (instituição financeira) da propriedade resolúvel e da posse indireta do bem móvel, essa transferência se dá para garantia da dívida assumida pelo devedor perante a instituição bancária. Assim, o devedor figura como possuidor direto ou depositário do bem até que o mesmo lhe seja liberado. Ou seja, o devedor não é proprietário do bem até que efetue o pagamento integral do financiamento. Ressalta-se ainda que, caso o devedor não efetue os pagamentos o banco retoma o veículo, recuperando dessa forma os valores dados em empréstimo.
Para dar publicidade a terceiros de que o veículo é a garantia de uma dívida (do financiamento em si), a informação de que o bem está alienado fiduciariamente à instituição financeira é cadastrada no Sistema Nacional de Gravame – SNG e respectivamente no registro no Certificado de Registro de Veículo – CRV a pedido da instituição bancária junto ao Departamento de Trânsito do estado em que está registrado o veículo. Essa informação impede, em tese, que o devedor transfira o veículo a terceiros sem a concordância do banco, dificultando a realização de fraudes.
Importante informar que tanto a inclusão quanto a retirada do gravame no Sistema Nacional de Gravames são de responsabilidade da instituição financeira e são feitas automática e eletronicamente por esta, sem qualquer intervenção ou pedido do cliente, conforme a Resolução nº320/2009 do Conselho Nacional do Trânsito – CONTRAN.
Desta forma, quando quitada a dívida não há mais interesse remanescente da instituição financeira. A manutenção da restrição caracteriza abuso de direito e, inegavelmente, ofende o patrimônio do proprietário do veículo, pois este está impossibilitado de vender ou transferir o bem a terceiro.
É necessário esclarecer que a instituição financeira é responsável tão somente pela baixa no Sistema Nacional de Gravames (sistema informatizado), sendo mera formalidade a emissão de novo Certificado de Registro de Veículo para a retirada da informação no documento, que é de interesse e responsabilidade do proprietário, isso porque, uma vez retirado o gravame no SNG o veículo já pode ser transferido a terceiros. Porém, ressalta-se que não há lei regulamentando o prazo para que a baixa no SNG pela instituição seja operada.
O Conselho Nacional de Trânsito – CONTRAN, buscando regulamentar a situação, possibilita às instituições o prazo máximo de 10 dias para retirada do gravame no SNG (Resolução nº 320/2009), porém, não há indicação de multa para o caso de descumprimento. Para os que possuem veículos registrados no estado de Santa Catarina, além da resolução acima indicada, o DETRAN/SC emitiu a Portaria nº 297/2013, que prevê mesmo prazo para que seja informada a quitação do contrato e, evidentemente, seja liberada a transferência do bem.
Contudo, muito embora editada Resolução ou Portaria – em razão da inexistência de lei sobre o assunto – os agentes financeiros nem sempre atendem tais dispositivos. Em certos casos, quando não ocorre a adequada retirada, a simples comunicação à instituição financeira bastaria para que o veículo fosse liberado e, portanto, permitida a sua transferência, porém, por diversas vezes há um completo descaso das instituições bancárias, que se negam a fazê-lo até que, a título exemplificativo, o consumidor efetue o pagamento integral de outro contrato entabulado com o mesmo agente financeiro. Operação completamente ilegal.
Em outros casos, as instituições simplesmente “esquecem” de proceder a retirada do gravame, mantendo-o por anos e causando sérios problemas de ordem material e moral ao proprietário, que, invariavelmente, precisa acionar o Judiciário para obrigar o procedimento de baixa.
Para regular essa lacuna legislativa e na tentativa de diminuir a judicialização da questão, está em tramitação na Câmara dos Deputados o PL nº 4.999/2013, de autoria do Deputado Federal Paulo Foletto, que busca estabelecer o prazo de 48 horas para que a instituição financeira faça a indicação da quitação do contrato de alienação fiduciária. O projeto ainda prevê multa no valor de 5% do valor do bem alienado, em favor do consumidor, para o caso de descumprimento.
Possivelmente o projeto de lei será de grande valia para todos que utilizam esta forma de financiamento, pois, ao que tudo indica, terão maior garantia de que a baixa do gravame por alienação fiduciária será realizada tão logo seja quitada a dívida, sob pena de multa às instituições que não o fizerem no prazo. Enquanto isso, os consumidores precisarão acionar o Judiciário por continuarem de mãos atadas com o completo descaso dos agentes financeiros.
Oscar Rodrigo Voit